sexta-feira, 22 de abril de 2016

De que Inconsciente se trata na Psicanálise? – por Carlos Mário Alvarez

Freud descobriu que os sonhos eram uma tentativa de realização de desejos Inconscientes. Fantasias e fragmentos de idéias que só poderiam se manifestar quando a censura fosse repousar junto com o corpo. Ou seja, que os sonhos seriam o momento onde muito daquilo sobre o que não se poderia saber em vigília apareceria de forma distorcida, portanto, transformada, nas cenas pictóricas oníricas.

Lacan, assim como Freud, formulou também várias hipóteses sobre o Inconsciente. Muitas destas hipóteses eram afirmadas na forma de frases ou axiomas contundentes, às vezes enigmáticos, seguindo à própria forma de manifestação do Inconsciente. Numa destas formulações, Lacan disse que “O Desejo (Inconsciente) é sempre Desejo do Outro”. Ou seja, que aquilo que alguém pode formular como Desejo não tem originalidade a partir do próprio indivíduo mas entra em uma cadeia de elementos que seguem, se acoplam, imitam, repetem, formas de desejar que estão em Outro lugar. Mas em que Outro lugar? Na voz tenra materna da mãe, no “não do Pai”, no olhar do amado, no tom de voz da babá, nas ordens da publicidade, nas bobagens ditas pelas “celebridades”…

Enfim, o Inconsciente de que trata a Psicanálise não é facilmente designável, não é apreensível e não representa as vontades manifestas ou ocultas de um ser. Ou seja, trata-se de um dispositivo que transforma afetos e representações (para utilizarmos a linguagem freudiana) em formas muitas vezes esquisitas, não facilmente explicáveis e, em geral, alienadas e alienantes. Não pertence a ninguém mas circula por aí, como poeira no vento.

Por isso, para que uma Psicanálise aconteça, é preciso que ela seja menos uma conversa entre dois para ser um “entra e sai” de idéias que se reorganizarão a partir de escolhas feitas sob novos prismas.

A Psicanálise precisa permitir que as falas se desdobrem, se redobrem e se desobriguem, assim, a significar o que se supõe que elas significam. O inconsciente será melhor tratado quando o analisando perder o fio da meada daquilo que diz (sintoma) e encontre e se afine com a errância daquilo que teme (o horror da castração, da finitude) .
Uma Psicanálise assim, toma o Desejo Inconsciente como condição e não como mal a ser debelado.


Carlos Mario AlvarezPsicanalista, Professor convidado da Sorbonne (Paris 2), Mestre em Teoria Psicanalítica (UFRJ) e Doutor em Letras (Puc-Rio) além de membro fundador da Formação Freudiana (RJ). Atualmente coordena o Projeto Psicanálise Descolada que oferece cursos sobre a obra de Freud, supervisão para Psicanalistas e Workshop.

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