domingo, 30 de agosto de 2015

Transferências como “veículos do desejo inconsciente” Cap.1, Parte III


Transferências como “veículos do desejo inconsciente”

 Se voltarmos nossa atenção para o capítulo VII de “ A interpretação dos sonhos”24de Freud, lugar onde ele estabelece sua metapsicologia acerca dos processos oníricos e onde , por conseguinte, discorre sobre a formulação da hipótese de um aparelho psíquico, encontraremos a utilização da expressão “transferência(s)” como  estando necessariamente vinculada com processos que ocorrem no interior desse mesmo aparelho psíquico.           
            Afirmamos de antemão que a transferência adquire , nesse momento, um novo sentido dentro do pensamento freudiano .  Nossa intenção, a partir de agora, é elucidar o estatuto que ganha a transferência dentro de “A interpretação dos sonhos” e a partir de então realizar as articulações necessárias que permitam  situar esse momento em questão  por relação à constituição do próprio conceito de transferência dentro da obra freudiana.
            Para que isso seja feito, torna-se necessário que se possa situar algumas questões que estão diretamente relacionadas com a utilização do termo “transferência(s)”.  Nesse sentido, nos interessará trabalhar principalmente o conceito de desejo, mostrando sua articulação e inserção na teoria dos sonhos, assim como será importante apresentar  a hipótese freudiana acerca do aparelho psíquico , esperando dessa forma, mostrar como se acha inserida a questão da transferência dentro da perspectiva de “A interpretação dos sonhos”.
           Ao tomar-se  “A interpretação dos sonhos” de Freud ao longo de seus sete capítulos, percorrendo-se todo o caminho que  o leva a dar aos sonhos um novo recorte epistemológico, fundando o que hoje se chama campo psicanalítico, pode-se admitir que se há uma hipótese que passa a sustentar todo seu trabalho, ela é evidenciada a partir da postulação de que todo sonho é a realização de    um desejo(inconsciente) .
              Nessa perspectiva, o que se chama de desejo deixa de ser uma noção vaga ou mesmo popular para ganhar dentro da psicanálise freudiana o estatuto de um conceito.  Conceito fundamental, é preciso dizer, e com uma especificidade própria que lhe dá a condição de existir articulado a outros conceitos e, portanto, fundando o próprio campo psicanalítico.
              Pensar o desejo dentro de “A interpretação dos sonhos”, enquanto conceito que marca toda a perspectiva do que se pode chamar de a primeira tópica freudiana, necessariamente nos leva a interrogar a respeito do que foi a criação de um sistema inconsciente por oposição a um sistema pré-consciente\ consciente e por conseguinte, a tentar , minimamente , compreender os mecanismos básicos que sustentam a dinâmica de funcionamento do aparelho psíquico.
            Assim, nos interessará agora, apreender um pouco do que Freud estabeleceu a partir de sua concepção do aparelho psíquico apresentada principalmente nas sessões (a), (b), (c) e (e) do capítulo VII de “A interpretação dos sonhos”.  Após empreendermos essa breve tarefa, acompanharemos Freud em sua formulação específica acerca do desejo, mostrando seu caráter fundamental no processo de causação dos sonhos .  Nesse ponto , estaremos aptos a evidenciar a estreita relação que se estabelece entre o movimento de desejo (tomando os sonhos como modelo) e a própria idéia de transferência tal qual ela é concebida , nesse momento, por Freud.
            A “primeira tópica” freudiana apresenta um modelo de aparelho psíquico que se encontra dividido em dois grandes sistemas: o sistema inconsciente (Ics) e o sistema Pré-consciente\ consciente(Pcs\Cs).  De início é preciso afirmar, junto com Freud que, essa topografia, não diz respeito a uma concepção física ou anatômica do  psiquismo.  Ao contrário, tal disposição diz respeito à uma hipótese topográfica que se sustenta a partir de hipóteses e inferências tiradas principalmente da observação clínica lato-senso( sintomas histéricos, lapsos de linguagem, sonhos).
            Vejamos como Freud introduz ele mesmo a sua topografia psíquica:
            “ Por conseguinte, retrataremos o aparelho psíquico como um instrumento composto a cujos componentes damos o nome de ‘instâncias’ ou (em prol de clareza maior) ‘sistemas’.  Pode-se prever, em seguida, que esses sistemas talvez mantenham entre si uma relação espacial constante, do mesmo modo que os vários sistemas de lentes de um telescópio se dispõe uns atrás dos outros  A rigor , não há necessidade da hipótese que os sistemas psíquicos se disponham  numa ordem espacial. Basta que uma ordem fixa fosse estabelecida pelo fato de, num determinado processo psíquico, a excitação atravessar os sistemas numa dada seqüência temporal”.25
            Para Freud, portanto, trata-se menos de uma espacialidade física a ser constatada antagonicamente do que de uma temporalidade quando se trata de evidenciar as mais variadas vicissitudes que sofrem os representantes psíquicos.  A temporalidade em questão diz respeito às próprias transformações que sofrem representações e afetos na dinâmica interior do psiquismo.
            Assim , o sistema inconsciente é definido como o lugar próprio das representações recalcadas, lugar onde se verifica a existência de investimentos que têm como característica uma mobilidade própria à uma concepção de energia livre , onde a partir de então as representações são capazes de se organizar desde a lógica das condensações  e dos deslocamentos.   Regido pelo processo primário, o sistema inconsciente não conhece a contradição entre os interesses de suas representações e também não funciona a partir da lógica causa-efeito. 
              Por hora, nos é suficiente afirmar que o sistema inconsciente, em última instância, é o lugar de articulação do desejo e que será próprio do desejo  exigir  constante representação na consciência.  O inconsciente, Freud o dirá, é incognoscível e só se pode afirmar sua existência através da verificação de seus efeitos que se fazem notar no sistema Pré-consciente\consciente.
            Esse sistema Pré-consciente\consciente, por oposição ao sistema inconsciente é o lugar onde se verifica toda a lógica própria ao que Freud chamou de processo secundário (energia ligada) .  Esse sistema, bem entendido, é capaz de dar qualidade às representações, através de suas ligações com as organizações afetivas, podendo também torná-las conscientes.  O sistema Pré-consciente\consciente é uma espécie de “palco” onde se apresentam os efeitos advindos do outro sistema.  Isso porque o inconsciente só se faz conhecer através do que Freud chamou de “produções do inconsciente”.  Nesse caso, está-se falando dos sintomas neuróticos, dos lapsos de linguagem, dos sonhos e dos chistes. As produções do inconsciente devem ser entendidas como formações de compromisso entre a intensidade energética própria ao movimento desejante e a possibilidade de representação oferecida pelo sistema pré-consciente\consciente.  Em breve estaremos em condições de mostrar que a transferência será , nesse momento, concebida exatamente como um dispositivo que veicula o processo de formação de compromisso.  Para que isso seja possível, é importante que passemos a compreender o sentido do movimento desejante próprio ao sistema inconsciente.  Assim, passaremos a acompanhar Freud em sua tentativa de definição do desejo.  A relação do desejo com a lógica da formação  dos sonhos nos servirá , aqui, de modelo.
             
             Na sessão (c) do capítulo VII , Freud constata que “o inconsciente nada tem a oferecer durante o sono  além da força propulsora para a realização de um desejo”26 Se pudermos nesse momento acompanhar a preocupação que se faz para Freud, vamos nos deparar com a tarefa de esclarecer a natureza psíquica dos desejos, recorrendo a uma reflexão a respeito da hipótese que trata da origem do aparelho psíquico.
            Segundo Freud, o aparelho psíquico teria atingido sua maturidade( ou seja, o aparelho psíquico constituído em dois sistemas tal como já o definimos acima) após passar por um período de aperfeiçoamento.  Acompanhando seu pensamento, temos que, de início, tal aparelho funcionava nos moldes de um arco reflexo, este com a intenção de manter-se livre de estímulos tanto quanto isto fosse possível.  Assim, qualquer excitação que incidisse sobre o psiquismo deveria fazer-se descarregar imediatamente através de sua extremidade motora.  Com o passar do tempo, são as exigências do mundo externo que aumentam e tornam-se paulatinamente mais complexas, exigindo que o aparelho se complexifique também a fim de continuar compatível com sua função principal, a saber, a de manter o nível de tensão interna o mais baixo possível.
            Freud avança em suas discussões ao chamar a atenção para o movimento intenso que imprimem ao psíquico as exigências internas. Associadas ao somático, essas exigências requerem do aparelho psíquico o dispêndio de uma força constante capaz de responder às exigências de “modificação interna”. Aqui, o já clássico modelo da fome, leva Freud a postular que o bebê só se vê saciado ao obter uma “vivência de satisfação” , que advinda do mundo externo, põe fim ao estímulo interno. Em termos de experiência psíquica, essa vivência de satisfação faz com que se inscreva um traço mnêmico que, associado à  percepção de satisfação , será a partir de então sempre re-investido quando num próximo momento a experiência de necessidade voltar a fazer exigências. Dessa forma, o aparelho psíquico lançará sempre mão do que Freud chama de moção psíquica para restabelecer a situação de satisfação original.
            Acompanhemos Freud, no momento em que define com precisão o conceito de desejo em “A interpretação dos sonhos”: “ uma moção dessa espécie é o que chamamos de desejo; o reaparecimento da percepção é a realização do desejo, e o caminho mais curto para essa realização  é a via que conduz diretamente da excitação produzida pelo desejo para um completo investimento da percepção”.27
            Nos interessará, nesse momento, avançar ainda mais na especificidade do conceito de desejo em “A interpretação dos sonhos” , buscando compreendê-lo cada vez mais em sua estreita ligação com os sonhos.  Veremos que é a partir dessa relação -  desejo\ formação onírica - que Freud situará a ideia da transferência.
            Logo no início da sessão(c), dedicada à realização de desejos , Freud se faz colocar a seguinte indagação: “ de onde se originam os desejos que se realizam nos sonhos?” 28 A partir daí ele vai estabelecer quatro possíveis fontes de origens  para o desejo. A primeira possibilidade, Freud a identifica nas situações em que o sujeito ao ser acometido por desejos e expectativas durante a vida de vigília, não pode realiza-las e se vê retomando-as em formas de sonho durante a vida onírica.  Nesses casos, tratam-se de desejos próprios ao pré-consciente, que retornam nos sonhos, sem mesmo estarem distorcidos, na perspectiva de serem finalmente realizados.  Aqui, podemos incluir também os sonhos das crianças, que, não tendo ainda  desejos recalcados, sonharão sempre com desejos próprios ao pré-consciente.
            A segunda possibilidade  que Freud vai indicar como possível fonte de origem para o desejo, é quando conteúdos representacionais da vida de vigília não podem ser aceitos  pelo sujeito e são por conta disso suprimidos da consciência.  Nesses casos, os desejos suprimidos são obrigados a recuar do sistema pré-consciente para o sistema inconsciente, ali passando a associarem-se com moções inconscientes.  Trata-se aqui, do modelo de ação do recalque.
            A terceira possibilidade para as fontes de origem do desejo nos sonhos é situada exclusivamente no sistema inconsciente.  Nesse caso o desejo nada tem em comum com a vida de vigília e obedece exclusivamente às leis que operam o sistema inconsciente.  (Como já fizemos menção, trata-se mais especificamente dos mecanismos de deslocamento e condensação).  Essa possibilidade, que indicará a função do movimento desejante na formação dos sonhos, nos interessará mais especificamente quando se tratar de situar o emprego do termo “transferência(s)”.
            Uma quarta e última localização para as fontes de origem do desejo estaria situada nas experiências somáticas.  A necessidade de urinar ou mesmo uma sede repentina poderiam levar o sujeito a sonhar com as satisfações desejadas e assim poder manter-se dormindo.
            A  questão fundamental  que vai se fazer colocar para Freud é a de saber se essas quatro fontes de origem do desejo nos sonhos teriam, em igual importância, a capacidade de provocar um sonho.  A resposta, em forma de uma negativa, é decisiva.  Os sonhos podem, é bem verdade, ter motivações oriundas de desejos não realizados durante a vida de vigília, serem provocados por desejos suprimidos do pré-consciente, ou mesmo serem instigados por necessidades fisiológicas.  Mas, o que afirma Freud com exatidão é que, nesses casos, esses desejos são apenas motivadores que contribuem para o estabelecimento dos sonhos.  Freud é enfático e claro ao dizer que o sonho não é viável se não tiver sustentação a partir de um desejo próprio ao sistema inconsciente.
            Passemos a palavra ao próprio Freud: “é minha suposição que um desejo consciente só consegue tornar-se instigador do sonho quando logra despertar um desejo inconsciente do mesmo teor e dele obter reforço”29.  E ainda prossegue Freud, salientando que tudo se passa num processo de transferências de intensidades onde o inconsciente se organiza e faz entrada no pré-consciente\consciente através do que à pouco referíamos  como “produções do inconsciente”  Acrescenta Freud: “ considero que esses desejos inconscientes estão sempre em estado de alerta, prontos a qualquer momento para buscar o meio de se expressarem quando surge a oportunidade de se aliarem a uma moção do consciente e transferirem sua grande intensidade para a intensidade menor desta última30.
            Portanto é no momento em que Freud situa o desejo inconsciente enquanto única fonte possível para provocar a formação de um sonho que iremos encontrar a postulação de que é justamente a transferência que vai viabilizar a “transação”  responsável pela  formação onírica.  A transferência é o que dá  a condição para que o desejo inconsciente faça sua aparição no sistema pré-consciente\consciente.  O movimento desejante, que como vimos, busca sempre representar-se na consciência, é levado a buscar vínculos com representações do sistema pré-consciente\consciente a fim do obter condições para atingir sua meta.  Para tal, o que se opera, através do que chamamos de formação de compromisso, é uma transferência de intensidades.  As intensidades das moções inconscientes são transferidas para representações que fazem parte da consciência.  Com isso, o desejo inconsciente é capaz de se fazer representar de maneira que possa burlar a censura que lhe impede naturalmente acesso à consciência.  Através de representações conscientes que mantenham relações de semelhança, proximidade e similitude com as representações do desejo inconsciente, a transferência dessas intensidades (do inconsciente para o pré-consciente\consciente) permite com que o desejo inconsciente faça “furo” na consciência de maneira que se apresente distorcido, como no caso das formações oníricas manifestas.   Nesse sentido, conclui Freud, “Aí temos o ato da ‘transferência’, que fornece uma explicação para inúmeros fenômenos notáveis da vida animica”.31 (513)
            A transferência não se daria exclusivamente no processo de formação dos sonhos, mas seria ela própria o meio pelo qual todas as produções do inconsciente se fariam existir.  Em outras palavras, toda formação de compromisso, própria de toda organização neurótica, seria sempre uma formação viabilizada pelo advento das transferências de intensidade.  Uma determinada representação que nada tem a temer por relação às exigências da censura, se presta, no advento do ato falho por exemplo, a receber o investimento de representações próprias ao sistema inconsciente que, por outro lado, anseiam em transferirem-se para o sistema pré-consciente\consciente.  Como vimos, o que se transfere, nesses processos, são as intensidades, as cargas de investimentos oriundas das representações inconscientes, que, fazem com que o sujeito do ato falho seja, ao mesmo tempo um sujeito do equívoco (trata-se de outra representação), assim como um sujeito que se vê afetado(a intensidade foi transferida) diante de sua própria posição falha.
            Ainda no campo próprio aos sonhos, Freud mostra a especificidade dos restos diurnos.  Dirá que eles tomam emprestado a intensidade do inconsciente no momento em que figuram no sonho e ao mesmo tempo “oferecem ao inconsciente algo indispensável - ou seja, o ponto de ligação necessário para uma transferência32 (514) Nesses casos , afirmará Freud na sessão (e) do capítulo VII: “Passa a existir no pré-consciente uma cadeia de pensamentos desprovida de investimento pré-consciente, mas que recebeu investimento do desejo inconsciente.”33(539)
            A transferência, nós podemos afirmar, opera através do que se pode definir como “deslocamento de afetos”.  As intensidades, nada mais são do que cotas de afetos que vão se deslocar do sistema inconsciente para o sistema pré-consciente\consciente até que se realize uma formação de compromisso capaz de satisfazer aos interesses de ambos os sistemas.  Aqui, a transferência opera enquanto veículo para que o desejo inconsciente possa se fazer representado na consciência.  Ora, se a transferência é ela própria parte do movimento desejante, então a grande novidade que existe nesse momento é a de que ela não é aqui concebida enquanto resistência.  Pois sabemos que, segundo Freud, ao menos em sua primeira tópica, o inconsciente não tinha como característica a resistência.  Não, ao contrário, o único movimento próprio ao sistema inconsciente é o de se organizar para ultrapassar a censura e se fazer, mesmo que distorcidamente, presente na consciência.  A resistência é a função de um ego, que, como vimos anteriormente, ameaçado pelo trabalho terapêutico, se vê obrigado a resistir contra o desvelamento do inconsciente.
            Assim, transferir é tão somente veicular o desejo e torná-lo um projeto viável para o sujeito. Nesse caso, a transferência não é nem empecilho e nem obstáculo.  Tampouco tratar-se-ía de algo a ser extirpado como um corpo estranho.  Ao contrário, a transferência é sempre bem sucedida na medida em que dá ao sujeito a capacidade de estabelecer-se de forma neurótica. 


SIGMUND FREUD


domingo, 23 de agosto de 2015

Transferência: no início, “uma falsa ligação”. Cap.1, Parte II

Transferência: no início, “uma falsa ligação”.  

No ano de 1894, Freud escreve um importante artigo denominado “As Neuropsicoses de Defesa”
13.  O que há de fundamental nesse texto é a hipótese que ele lançará acerca da etiologia da histeria.  Tal hipótese, o fará se distanciar de importantes pensadores acerca da histeria em sua época.  Está-se fazendo menção aqui à Pierre Janet e o próprio Joseph Breuer.  Podemos dizer  com toda certeza que, se por um lado,  o artigo em questão deixa Freud solitário na sua tentativa de entendimento e cura da histeria e , por outro lado,  ele o coloca mais perto de fundar o campo pertinente à psicanálise.
            Se nos dermos ao trabalho de acompanhar Freud em sua trajetória ao longo do artigo em questão, veremos que ele parte de uma apresentação sucinta acerca das posições teóricas sobre a histeria de até então.  Veremos que, tanto para Janet quanto para Breuer, a histeria será sempre um processo de divisão da consciência onde se pode verificar a emergência de organizações psíquicas diferenciadas  e independentes uma da outra.  Se para Janet, o que se dá é um processo de deficiência inata, onde o histérico é incapaz , por conta de sua própria constituição,  de realizar uma síntese do psiquismo, tratando-se portanto de uma hipótese degenerativa, para Breuer, como já tivemos a oportunidade de acompanhar, o problema se verificaria por conta do que ele chamou de “estados hipnóides”.  Nessa perspectiva, Breuer não pensa a divisão da consciência como degenerativa e inata, mas sim como secundária e adquirida, ocorrendo por conta da relação de independência que os “estados hipnóides” mantêm com o resto da consciência.
            Freud trará uma novidade.  Podemos dizer que essa novidade é decisiva e impõe obrigatoriamente uma concepção dinâmica e econômica do  processo histérico completamente distintas das propostas por Janet e Breuer.  Freud propõe, em oposição à ideia de “histeria hipnóide”, a ideia de “histeria de defesa”.  A novidade fica por conta de todas as implicações teóricas trazidas e articuladas pela noção de defesa.
            Ao propor a “histeria de defesa”, Freud trabalha com a hipótese de que o histérico seria assaltado por determinadas representações que se mostrariam incompatíveis com o modelo de sua vida representativa.  O que ocorreria é que, nessas situações, o eu do sujeito se veria diante de determinadas experiências, determinados afetos que trariam em si a qualidade de serem aflitivos, penosos e indesejáveis.  O que ocorre a partir de então, é um processo pelo qual o eu é levado a esquecer tais experiências aflitivas devido a sua incapacidade de suportá-las através do pensamento comum de sua consciência vigente.  O processo pelo qual o eu se esquiva das representações penosas é denominado por Freud de defesa.
            Em que consistiria em termos econômicos e dinâmicos esse processo de defesa?  Freud explica que o que se passa é que “o eu transforma essa representação poderosa numa representação fraca, retirando-lhe o afeto - a soma de excitação- do qual está carregada14.(56) Esse processo, bem entendido , faz com que a representação fraca não opere mais enquanto exigência ao psiquismo, tornando-o livre do peso aflitivo que ela impunha ao eu anteriormente.  No entanto, a quota de afeto antes vinculada à representação penosa acabará por vincular-se a outras representações. É o destino dessa quota de afeto que definirá o tipo de neurose em questão.
              Se a defesa é de cunho histérico, o que se dá é que essa quota de afeto liberada é transformada em inervações de ordem somática.  Eis aí a explicação para os sintomas histéricos. Trata-se sempre de conversões do afeto, antes ligado a representações aflitivas, em sintomas que terão como representação, os órgãos do próprio corpo.  Nesse ponto, Freud vai além de Janet e Breuer, dizendo que na histeria, o que impera é a capacidade para a conversão suscitada a partir de um conflito  entre o que é insuportável para o eu e o que  lhe é psiquicamente compatível.
            A partir da noção de defesa, a neurose obsessiva também ganha seu entendimento.  Quando o sujeito se vê diante de representações insuportáveis e quando a capacidade para a conversão inexiste, o eu se defende também enfraquecendo tais representações penosas, retirando-lhes a quota de afeto.  O que marca a escolha obsessiva é o fato de que o afeto não é convertido somaticamente mas sim deslocado de representação em representação, ficando sempre restrito à ordem psíquica.  As representações que o afeto deslocado investe, tornam-se, por esse processo, representações obsessivas.
            Mas a importante questão a se fazer , nesse ponto, é a seguinte: o que é preciso para que um grupo determinado de representações seja de caráter aflitivo para o eu?  Ou de outra maneira, é possível indagar : para que haja defesa no sentido neurótico, basta que o eu se sinta ameaçado?  O que Freud vai responder é que a defesa neurótica incide sempre, em última instância, sobre representações que sejam de cunho sexual.  A defesa é sempre uma defesa contra a ameaça do sexual.  Vejamos o que diz Freud a esse respeito quando analisa a defesa obsessiva:
            “Em todos os casos que analisei, era a vida sexual do sujeito que havia despertado um afeto aflitivo, precisamente da mesma natureza do ligado à sua obsessão.  Teoricamente não é impossível que esse afeto possa às vezes emergir em outras áreas; resta-me apenas relatar que, até o momento, não deparei com nenhuma outra origem.  Ademais é fácil verificar que é precisamente a vida sexual que traz em si as mais numerosas oportunidades para o surgimento de representações incompatíveis15.
            Com isso temos que a idéia de defesa é o que sustenta a divisão da consciência e é a verdadeira responsável pelas formações sintomáticas tanto histéricas quanto obsessivas.  O sujeito torna-se neurótico porque não suporta sua própria exigência sexual.  Toda a idéia sustentada por Freud é a de que a neurose é uma espécie de substituta  da vida sexual incompatível, ocupando o sujeito e livrando-o do duro fardo de ter que decidir sobre conflitos e exigências da ordem do sexual16.
           
            A descoberta da noção de defesa e por conseguinte a constatação da estreita relação entre neurose e sexualidade levaram , como já dissemos, Freud a distanciar-se de Janet e principalmente de Breuer.  Mesmo nos “Estudos sobre a histeria”17, escritos em conjunto com Breuer, no ano de 1895, Freud já mostra-se afastado dos próprios caminhos terapêuticos trilhados originalmente por Breuer.  No capítulo IV deste livro, intitulado “A psicoterapia da histeria” ele anuncia um novo método de tratamento e investigação das neuroses .  Essa superação se deu não só por dificuldades técnicas encontradas por Freud no manejo do método de Breuer, mas também pelas motivações teóricas acima demonstradas(a relação entre defesa, conflito e sexualidade) que lhe impunham  uma concepção dos sintomas neuróticos, e , por conseguinte, do psiquismo, totalmente novas. 
            No que diz respeito mais especificamente à técnica, o que se impunha a Freud como dificuldade era, em primeiro lugar, o fato de que nem todos os pacientes eram hipnotizáveis.  Por mais que fossem histéricos,  muitos não se submetiam à hipnose.  No entanto, Freud ainda precisava da hipnose para obter o que chamava de “ampliamento da consciência” a fim de chegar às lembranças patogênicas esquecidas.  Era necessário, portanto, que ele procurasse obter tal ampliação, mesmo que fosse através de outros recursos que não  se utilizassem da hipnose.
            O recurso que Freud passa a lançar mão é o da concentração.  Através de uma provocação insistente, a saber, a de que o paciente certamente se lembraria do material demandado, Freud passava a insistir com que o paciente fizesse um esforço e superasse as dificuldades que o deixavam alienado da lembrança patogênica.  Com o pedido de que se deitassem e fechassem os olhos  concentrando-se, Freud passou a ter bons resultados à revelia do método catártico de Breuer. Criava-se assim, um novo método, que ao invés de lançar mão da hipnose, buscava chegar até o material patológico através de um processo de investigação psíquica onde o paciente era levado a associar sempre em busca de conexões relacionadas a seu sintoma. Diz ele:
            “Verifiquei então que, sem nenhuma hipnose, surgiam novas lembranças que recuavam ainda mais no passado e que provavelmente se relacionavam com o nosso tema.  Experiências como essas fizeram-me pensar que seria de fato possível trazer à luz, por mera insistência, os grupos patogênicos de representações que, afinal de contas, por certo estariam presentes.”18(264)
            De imediato uma nova tarefa fez-se presente na operação empreendida por Freud.  O terapeuta , ao insistir em trazer à tona material psíquico desejado, encontrava contra a direção do seu trabalho, a imposição de forças psíquicas que resistiam ao apagamento da amnésia neurótica.  Freud se dava conta de que era preciso que o médico empreendesse todo um esforço no sentido de superar as resistências que eram erguidas contra suas expectativas.  Ora, conclui Freud:  se existem resistências que se opõe ao preenchimento das lacunas de amnésia, essas devem ser movidas pelas mesmas forças que outrora desempenharam um papel fundamental na formação do sintoma histérico e que impediu que a representação patológica tivesse tido acesso à consciência.
            Trata-se do nascimento do conceito de resistência.  A resistência se faz presente lá onde algo precisou operar enquanto recalcamento(defesa).  Ela denuncia a existência de uma impossibilidade de o sujeito ter acesso a certas representações específicas.
            No que diz respeito ao plano teórico, é preciso afirmar que o conceito de resistência nasce intimamente relacionado com a noção de defesa e recalque.    Já vimos como Freud constrói a noção de defesa a partir da ideia de que o eu não suporta certas representações de cunho  aflitivo.  Vimos também que estas representações são sempre de cunho sexual .  Nos “Estudos...”, Freud diz que a defesa faz com que a representação insuportável seja expelida da consciência através do recalcamento.19  No entanto, o fato dessas representações se encontrarem fora da consciência não implica que elas tenham deixado de existir.  Vimos no artigo sobre “As neuropsicoses de defesa” que tais representações se desprendem de seus afetos  e passam a ficar sem importância para a consciência. O que sustenta o argumento de Freud de que seu método de investigação é eficaz é justamente a hipótese de que é possível, através de um trabalho de associação, trazer à tona o material esquecido(enfraquecido) e reintegrá-lo a vida psíquica do sujeito.  Tudo o que é preciso para isso, é fazer com que a resistência à lembrança seja vencida.
            O trabalho terapêutico se vê assim modificado.  Para Freud,  o problema da resistência ganhará importância fundamental e a tarefa principal do médico passa a ser superá-la a cada instante de sua aparição.  É preciso seguir o fio da meada que deve conduzir às causas do sintoma e a cada vez que a narrativa do paciente emperrar, ou, a cada vez que seu discurso se mostrar reticente ao avanço proposto pelo tratamento, o terapeuta deve assinalar o momento de resistência e fazer com que o paciente se convença a abandonar sua posição resistente.
            A resistência se apresenta de várias formas.  Ela pode ser um “não querer dizer”, um “não querer saber”, uma recusa à associação  que pode ter como conseqüência até mesmo o silêncio por parte do paciente.  Quanto a isso , comenta Freud: “A persistente resistência do paciente é indicada pelo fato de que as ligações se interrompem, as soluções não aparecem e as imagens são recordadas de forma indistinta e incompleta.20”(274) É preciso fazer notar que a resistência é para Freud, antes de mais nada, o lugar onde a fala do paciente não encontra coerência. É precisamente quando lacunas se fazem presentes no discurso, quando a lógica do pensamento consciente falha que Freud vai circunscrever algo próprio à resistência.
            É importante reconhecer que o texto “A psicoterapia da histeria” é um trabalho eminentemente técnico.  Como tal, a preocupação de Freud se verifica em demonstrar o resultado de seus empreendimentos clínicos junto à histeria, explicitando seu método terapêutico. Vimos que Freud , ao passar do método catártico de Breuer para a criação de um método próprio , acabou por constituir o conceito de resistência como   fundamental para definir a posição que ocupa o terapeuta em sua prática:  como tentamos demonstrar, ele trabalha, principalmente, vencendo resistências.  Com isso, o texto em questão , podemos arriscar  dizer, constitui-se quase que como um tratado sobre a resistência. É em torno desse conceito que giram todas as questões pertinentes ao trato da histeria   e é nessa medida  que ele nos interessa como material de estudo em nossa dissertação.
            Nosso objeto de estudo nesse capítulo  é a transferência na primeira tópica de Freud.  Nesse texto, temos pela primeira vez a emergência da palavra “transferência” dentro da obra freudiana: ela aparece aqui como mais uma resistência que se impõe ao tratamento, um empecilho que deve ser vencido e entendido da mesma maneira que os outros sintomas.  Nesse momento, nosso interesse será acompanhar o pensamento de Freud, mostrando como ele concebe a transferência , como ele a define e como ela se relaciona com a resistência propriamente dita.
            Ao fim do texto, após explicar exaustivamente seu procedimento terapêutico e de insistir sobre a importância fundamental que ganha a resistência na tentativa de cura das neuroses, Freud anuncia três possibilidades de possíveis falhas no empreendimento de seu método.  São elas: a primeira , que não necessariamente significaria uma falha mas sim um limite, diz respeito à possibilidade de o material a ser elucidado ter-se esgotado.  Nesse caso, não haveria mais nada a ser lembrado.  A segunda possibilidade diria respeito ao surgimento de uma resistência que só poderia ser superada posteriormente, devendo aguardar um momento de amadurecimento  do tratamento.  Finalmente, a terceira possibilidade mostra que a relação médico-paciente surge como um obstáculo a ser enfrentado e superado, na medida em que impediria, por determinadas circunstâncias, o prosseguimento do tratamento .  Diz Freud: “Isso acontece quando a relação entre o paciente e o médico é perturbada e constitui o pior obstáculo com que podemos deparar.  No entanto podemos esperar encontrá-lo em qualquer análise relativamente séria21.
            Nesse ponto Freud marca com veemência a necessidade de o médico desempenhar, através de sua figura, um importante papel no processo de derrotar resistências. O médico deve ser habilidoso e cauteloso ao mesmo tempo.  Lembra que as pacientes mulheres podem ter inibições em falar de suas vidas sexuais e que caberia ao terapeuta uma atitude cordial para que o trabalho pudesse seguir seu curso.  No entanto, a possibilidade da relação ser perturbada por desavenças entre médico e paciente levam Freud a formular Três formas de presentificação do obstáculo em questão:
            A primeira, talvez a menos séria, seja quando acontecer de ocorrerem desavenças pessoais. Queixas contra o médico no sentido de acusá-lo de ser negligente com o próprio paciente, é um exemplo citado por Freud.  A solução, dirá Freud, é uma boa conversa onde as coisas seriam revistas e as arestas devidamente acertadas.
            A segunda forma de obstáculo, é quando o paciente se queixa do fato de estar se tornando dependente do médico.  Freud dirá que isso é uma vicissitude própria ao tratamento e que a resistência se apresentará na forma de novos sintomas que estejam em articulação com a queixa em questão.
            A terceira forma de obstáculo, finalmente, é a que nos interessa mais especificamente.  Freud diz com todas as letras que o problema se dá quando o paciente transfere seu complexo representativo, suas aflições afetivas para a figura do médico.  Ele dirá que se trata de algo usual e frequente nas análises.  “a transferência para o médico se dá por meio de uma falsa ligação22.
            Essa “falsa ligação”, é fruto de um deslizamento da representação recalcada que se vê obrigada a investir a figura do médico a fim de receber existência na consciência. Trata-se da aparição de um desejo que se presentifica, através do que Freud chama de “compulsão à associar”,  graças à  existência de um médico que está afetivamente envolvido na vida anímica da paciente e que por isso se presta a ser uma “mesalliance”, uma espécie de elo equivocado no circuito desejante do paciente.
            Para Freud, a transferência, enquanto “falsa ligação” deve ser compreendida como um novo sintoma que “deve ser tratado da mesma forma que os sintomas antigos”.  A tarefa do terapeuta, dirá Freud, é “tornar o obstáculo consciente para o paciente23 
            A transferência se afirma aqui como resistência ao tratamento .  Como toda resistência, nós pudemos acompanhar, seu destino é ser vencida e desvendada.  Caberá ao analista esclarecer esse mal entendido e recuperar para o bojo do tratamento, as representações adequadas, ou seja , aquelas que verdadeiramente se adequariam aos afetos em questão.        
            Nesse sentido, podemos afirmar que a primeira concepção que Freud formula em torno da transferência limita-se a entendê-la enquanto um acontecimento indesejado, uma espécie de imprevisto que obrigatoriamente estaria desviando o tratamento de seu bom caminho.  Se o objetivo do médico era chegar às representações patógenas, à uma espécie de núcleo causal do sintoma, a transferência aparece como um  “convidado”  inoportuno , uma espécie de penetra de festa que , ao roubar a cena, estaria certamente perturbando a busca do material desejado.  A transferência é uma espécie de mal, dirá Freud, um mal que se revelará inexorável e ao terapeuta caberá a função de o quanto antes estabelecer a correta direção das associações.  O destino da transferência, aqui, como o de toda a resistência, é o de ser extirpada tal como se fosse um “corpo estranho”.  

            Interessante observar que , como tentamos mostrar, Freud está atento às questões que envolvem a relação terapeuta-paciente.  Como salientamos, ele se preocupa em descrever algumas vicissitudes dessa relação como altamente perigosas para o bom desenrolar da tarefa terapêutica.  O que nos interessa dizer, é que , por mais que estivesse cônscio acerca de muitos obstáculos que a relação poderia trazer ao tratamento, Freud , no entanto, não entendia como pertinentes à transferência o conjunto dessas relações.  Não, para Freud, a transferência nesse momento, restringia-se a ser tão somente a maneira pela qual a representação da figura do médico, equivocadamente, assumia o lugar de uma outra representação que não estaria sendo dita.  Futuramente, nós veremos, o que era apenas uma designação (transferência como falsa-ligação), tornou-se paulatinamente um conceito fundamental dentro da obra freudiana.  É nosso interesse mostrar que a concepção acerca da transferência tornou-se cada vez mais complexa, passando a possuir, de acordo com o desenvolvimento do pensamento de Freud, uma série de “facetas” da qual a resistência sempre foi uma delas.

Sigmund Freud


sábado, 15 de agosto de 2015

Início da discussão sobre a transferência: o caso Anna O. Cap.1, Parte I .

Início da discussão sobre a transferência: o caso Anna O.

“Se algum mérito existe em ter dado vida à psicanálise, a mim não cabe, pois não participei de suas origens.  Era ainda estudante e ocupava-me com meus últimos exames, quando outro médico de viena, o Dr. Joseph Breuer, empregou pela primeira vez êsse método no tratamento de uma jovem histérica(1880-1882)” (Freud)


Essa citação, extraída  da primeira das “Cinco lições de psicanálise”, proferidas por Freud quando da ocasião de sua viagem aos Estados Unidos (1909),  mostra a importância que ele conferia ao trabalho de Breuer e indica o  valor desa experiência dentro da história da Psicanálise:  trata-se de um momento inaugural, onde o método terapêutico e a investigação psíquica aí realizados por Breuer, apontaram para o início do estabelecimento de um campo que futuramente passou a ser reconhecido, a partir de Freud, como o campo psicanalítico.  Assim, o peso do reconhecimento que Freud concede a Breuer, se não  legitima a experiência desse último como uma experiência analítica, ao menos lhe confere o registro de uma marca pioneira.
Verdade seja dita, Freud cinco anos mais tarde, reviu sua posição e , influenciado já por uma sociedade analítica, decidiu não mais reconhecer a experiência de Breuer como marco inaugural da psicanálise resolvendo assumir para si próprio toda a paternidade da psicanálise. O argumento por Freud utilizado é o de que a ele caberia ter formulado o legítimo método analítico, a saber, o que teria no trabalho de escuta, a exigência de se estabelecer uma única regra fundamental - a  das associações livres.  Assim, Freud apoiado por um grupo de analistas próximos a ele  passa a compreender “o método analítico de Breuer  como um estágio preliminar da psicanálise, e a psicanálise em si como tendo tido início quando deixei de usar a técnica hipnótica e introduzi as associações livres”.
Mesmo que Freud e os analistas aceitem essa divisão, mesmo que a experiência de Breuer, se avaliada  desde a perspectiva de um  método, possa ser entendida apenas como uma precussora  de uma  psicanálise propriamente dita,  e mesmo que Breuer não tivesse uma teoria acerca do inconsciente e da sexualidade, não nos parece ser possível deixar de reconhecer que já alí, exatamente no que diz respeito ao tratamento de Anna O., havia o trato de questões que se apresentavam como próprias ao interesse da própria teoria psicanalítica.  Na verdade, se Freud pôde criar a psicanálise, se ele pôde estabelecer paulatinamente uma teoria da sexualidade, se ele constroi um aparelho psíquico a partir de uma concepção específica do inconsciente e se ele faz da idéia de resistência, um conceito eminentemente clínico, tudo isso é feito -  ao menos inicialmente -  numa perspectiva crítica ao trabalho de Breuer.  O desenvolvimento desse capítulo procurará deixar essas considerações satisfatoriamente explicitadas.
Como nosso objeto de estudo nesse capítulo é a realização de um rastreamento do conceito de transferência na “primeira tópica” de Freud, acreditamos ser importante poder apontar para o momento onde ele faz  sua aparição inicial  , assinalando desde já que não se trata de realizar uma gênese do conceito, nem tampouco de aceitar a tarefa de realizar um estudo que se fizesse nos moldes de um desenvolvimento do conceito de transferência na obra de Freud.  A proposta está muito mais próxima a uma tentativa de problematizar a questão da transferência em importantes momentos da obra de Freud.  O primeiro deles, nós acreditamos, é justamente quando ele ainda  não interage com sua obra e quando , a partir do relato do caso Anna O., nos é possível não só entender o que faz Breuer (ou não faz), onde sua prática encontra seus limites,   bem como a crítica da qual parte Freud para , em se distanciando da experiência de Breuer, fundar a psicanálise e com ela , o conceito de transferência.  O caso Anna O. , nos interessa na medida em que , em se tratando de uma experiência pré-analítica, torna-se palco para pensar-se, a posteriori, os efeitos e implicações do que se pode chamar de transferência.  Se Breuer não faz uma teoria da transferência, por outro lado, seu relato deixa rastros que indicam que a transferência alí se fez presente, mesmo que de forma embrionária.  Nos interessará nesse momento, acompanhando o texto de Breuer, realizar uma discussão inicial acerca da transferência.

Ao descrever sua paciente, Breuer reconhece na jovem moça de vinte e um anos de idade, alguém que dispunha de uma “notável inteligência”, dotes poéticos, e que era capaz de  imaginar as mais diversas e bizarras fantasias.  Sabe-se pelo próprio Breuer que se tratava de uma bela moça e pode-se ler nas entrelinhas uma curiosa observação: Anna O. , assim ele a decidiu chamar, era algúem que “nunca se apaixonara”,  e que por conta mesmo disso, poderia se verificar que “a noção de sexualidade era surpreendentemente não desenvolvida nela”.  O curioso em questão, é que poderá se notar, a partir de uma leitura cuidadosa do caso, que tudo o que faz Anna O. , ao longo de sua relação com Breuer, é viver uma situação onde sua entrega e total confiabilidade ao médico acabam por revelar uma situação de apaixonamento intenso.  Seu quadro histérico, a sintomatologia em questão, farão com que Freud denuncie mais tarde , a cegueira de Breuer quanto tudo a que dissessse respeito ao campo do sexual.  A sexualidade de Anna O. estava na superfície, espalmada e disfarçada através de suas horripilantes formações sintomáticas.
Quanto a seus sintomas, eles poderiam ser compreendidos como fazendo parte de um quadro clássico de histeria da época onde eram frequentes  paralisias e anestesias dos membros superiores e inferiores, perturbações de visão, tosse nervosa, repugnância para ingerir alimentos, dentre outras(nota mostrando onde Breuer fala dos sintomas, pág.58,59).  Além disso, Anna O. por um considerável tempo não conseguia se expressar na língua alemã - sua língua de origem-, falava apenas em inglês e com frequência experimentava estados de “absence”, onde imperavam ausência da personalidade e estados de confusão.
Esses estados de “absensces”, bem entendido, eram situações onde se verificavam uma espécie de divisão da consciência onde Breuer assinalava para a existência concomitante de dois estados de consciência distintos que costumavam se alternar, revelando, no caso de Anna O., hora uma atitude serena e comportada, hora uma situação onde se verificava a emergência de um ataque histérico propriamente dito.
A teoria formulada por Breuer e Freud na ocasião, é a da existência de “estados hipnóides”.  Tais “estados” tinham como  característica peculiar o fato de se constituírem como grupos isolados de representações demasiadamente investidas capazes de alienarem-se enquanto associações do resto da consciência, provocando uma dissociação psíquica constitucional. O ataque histérico, seria a emergência de um estado hipnóide que se encontraria completamente desconectado da consciência vigente do sujeito.  Nas “comunicações preliminares”, Breuer e Freud explicitam a relação direta entre os “estados hipnóides” e a estrutura histérica: “...a divisão da consciência, que é tão marcante nos casos clássicos conhecidos sob a forma de ‘double conscience’, acha-se presente em grau rudimentar em toda histeria(...)”.(48)
Breuer, cedo, pôde notar, ao lado dos estados de “absense”, uma inclinação da paciente a realizar o que ele chamou de “teatro particular”.  Com isso ele desde cedo pôde se interessar e  apontar para uma capacidade fantasística  de Anna O., capacidade essa que fazia com que ela se entregasse à um exercício de “criar historinhas”  onde era capaz de viver verdadeiros contos de fada.  Breuer se interessou por essas “historinhas”.  Mais que isso ele se deu conta de que elas tinham uma função no estado psíquico da paciente.
Ter se interessado pelos devaneios de Anna O., certamente fez de Breuer um médico diferente.  Ele percebeu que toda vez que a paciente podia narrar, sob hipnose, suas alucinações, suas construções fantasísticas, ela despertava da hipnose de forma aliviada.  Quando à visitava à tarde, ele diz, Anna já o aguardava sob um estado auto-hipnótico, onde esperava que o Dr. Breuer pudesse reconhecer nas suas lembranças, todo um sofrimento e aflição que ela experimentava durante suas “absenses” ao longo do dia.  Comprovando a eficácia de sua intervenção, Breuer escreve: “Era um contraste realmente notável: durante o dia, a paciente irresponsável, perseguida por alucinações, e à noite a moça  com a mente inteiramente lúcida.”(62)
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Esse trabalho, o de desencadear a narrativa de histórias (devaneios) a partir de um estado de hipnose, realizava-se através de um exercício catártico onde a paciente, ao falar, exprimia sensações as mais diversas como tremores de horror, gritos, choros, etc.  A “talking cure”, ou “limpeza de chaminé”, denominações advindas da própria paciente para o método catártico de Breuer, realizava o que era até então inviável para ela: dar expressão verbal às alucinações e afetos que eram  até então vividos  unicamente sob a forma de estados de “absense” . 
Se recorrermos ao texto  “comunicações preliminares”, teremos com clareza a explicitação metapsicológica do que se passava no método catártico formulado por Breuer .  A tese lançada então por Breuer e Freud é a de que a etiologia da histeria e das neuroses traumáticas estaria diretamente relacionada com a existência de causas desencadeadoras, consideradas traumas psíquicos.  Um trauma seria ocasionado por qualquer experiência capaz de despertar afetos aflitivos, que, devido à sua intensidade e qualidade, permaneceriam no psiquismo sem  obterem descarga.  Tal afeto traumático permaneceria no psiquismo como um corpo estranho em atividade.  A atividade em questão, seria a própria formação dos sintomas histéricos.
Partindo desse achado, a pesquisa de Breuer e Freud acabará por indicar o caminho da dissolução do sintoma: ele desaparecerá quando, através do método catártico, for possível trazer à tona com clareza as representações traumáticas e seus respectivos estados afetivos.  O método catártico consistia em , sob estado de hipnose, induzir o paciente a descrever as situações envolvidas na problemática dos sintomas histéricos,  de maneira insistente até que os afetos em questão fossem, transformados em palavras.  O esssencial, é preciso frisar, é que houvesse a ab-reação dos afetos implicados na situação traumática.
Assim, é preciso dizer que o fato de Breuer ter se interessado pelo teatro particular de Anna O., e com isso, ter , através do método catártico, viabilizado a ab-reação dos afetos estrangulados, dando um destino às representações que sustentavam toda a condição sintomática de Anna O., tudo isso fez com que ele tivesse na economia psíquica de sua paciente um lugar específico que merece nossa atenção.  Podemos inverter também a proposição e dizer que, por conta de um lugar específico que Breuer passou a ocupar na economia psíquica de Anna O., por ele ter se oferecido como possibilidade de ancoramento para uma fala que carecia de um destinatário , ele estabeleceu uma espécie de situação que o diferenciou dos outros médicos que dela tentaram tratar.  Com isso, estamos criando condições para lançar algumas considerações iniciais sobre a transferência.
Desde o início, Breuer estabeleceu com sua paciente uma relação de proximidade.  Todo o aparente nonsense trazido pelos ataques histéricos de Anna O., pareciam se esmerilhar diante da paciência de Breuer.  Mais que isso, Breuer se investia de uma certa sapiência sobre os motivos sob os quais repousavam a insatisfação da Srta. O. . Por exemplo, ele diz com todas as letras que sabia que ela perdera sua capacidade de articulação verbal devido a algo que ele (Breuer) teria dito e que provavelmente a teria aborrecido(60).  Mesmo sem se dar conta, Breuer fazia refinadas interpretações que tinham como gancho as nuanças da relação terapêutica que alí se estabelecia.  As interpretações que tomavam a pessoa de Breuer como centro das atrações, tornaram-se uma constante no tratamento e podemos afirmar que algo da ordem do que se conheceu mais tarde como relação trasferencial já se insinuava no caso Anna O.  Em breve, no desenrolar desse capítulo, estaremos tratando especificamente da idéia de “relação transferencial “tal como ela se encontra desenvolvida na obra de Freud.
Breuer chega a ser exaustivo e parece mesmo utilizar-se disso como um triunfo: ele mostra o tempo todo que Anna O.  o reconhecia como sendo o único capaz de realizar progressos em seu estado.  Nas ocasiões mais dramáticas, quando o sintoma parecia levar a uma espécie de desestruturação drástica, quando em seus estados de “absense”  a paciente era obrigada a fazer um trabalho de “recognizing work” para poder identificar cada pessoa que a ela se dirigia, quando até isso parecia ser uma tarefa da ordem do impossível, era a Breuer quem ela reconhecia sem qualquer dificuldade.  Ele sempre estava lá, sempre pronto a ser uma espécie de estofo onde o despenhadeiro ocasionado pelos ataques histéricos ganhavam seu limite: “...eu era a única pessoa que ela sempre reconhecia”, exalta um confiante Breuer.
Quando sua condição sintomática a levava a uma situação desesperadora a ponto da formação de um quadro anoréxico, quando Anna parecia que ía definhar, lá estava o presente Breuer, o único capaz de fazer com que ela se alimentasse.  Breuer conta que sua paciente fazia pouca questão de prestigiar seus outros médicos.  Ele era o único.  Em certa ocasião, quando teve que ausentar-se durante vários dias, ao retornar encontrou sua paciente regredida em estado de “absenses” alucinatórias, vendo figuras assombrosas tais como caveiras e esqueletos.  À medida em que as limpezas de chaminé prosseguiam, os laços entre os dois se tornavam cada vez mais acirrados.  Para falar, só se fosse com Breuer.  Para saber se se tratava de Breuer, a paciente chegava ao ato de apalpá-lo: “...ela jamais começava a falar antes de haver confirmado plenamente a minha identidade, apalpando-me as mãos com cuidado”.(65)
Todas essas indicações, que se mostram presentes do começo ao fim do relato da experiência de Breuer com Anna O., mostram que  o ponto de motivação para que a “talking cure” se realizasse, estava no fato de que Breuer se investiu e foi investido de um lugar destacado na economia do processo terapêutico.  Trata-se de uma angulação que se fez articular de tal maneira que se tornou viável para Breuer reconhecer os sintomas de sua paciente desde uma perspectiva subjetiva. Isto é, podemos afirmar que o que dá condições para que o trabalho de ab-reação fosse realizado, é justamenteo fato de Breuer ter viabilizado um endereçamento para a fala de sua paciente.  Breuer se descobre como destinatário de uma fala aparentemente desconexa e encarna com toda propriedade o lugar de alguém que reconhece um sentido para o que era  vivido até então como puro sintoma histérico  Esse reconhecimento, impossível não notar é o que faz Anna O. eleger Breuer como objeto de amor, um amor que podemos hoje chamar de transferencial.  Sobre o amor transferencial, trataremos mais adiante, mostrando todo o desenvolvimento que ele ganha a partir da obra freudiana.
O caso Anna O. tem aí seu limite.  Se podemos falar em  um sucesso terapêutico de Breuer, podemos dizer que ele se encontra no alívio e remissão temporária dos sintomas.  Se Breuer escuta Anna O., se ele se permite se fazer destinatário para uma fala histérica, ele dá provas de que não sustenta essa posição.  Se podemos dizer que Anna fala para Breuer, isso vai até onde os sintomas não incluíam  Breuer em suas representações.  Todo o limite do caso em questão está no fato de Breuer não dispor de uma teoria da sexualidade e do inconsciente, que lhe indicasse o valor de todo endereçamento histérico: ele ganha seu entendimento  a partir da lógica do desejo inconsciente.
Sabe-se através do próprio Freud(nota) que Breuer abandonou o caso de Anna O. por conta do aparecimento de um sintoma impossível de ser por ele reconhecido e sustentado.  A Pseudociese de Anna O., amor de transferência fecundado em acting -out  histérico, foi para Breuer sua saída de cena.  Ele suportou o método catártico.  A transferência, não.
Ao comentar o caso, vinte anos mais tarde, Freud  retoma a questão, justamente pela via que nos interessa: ele dirá que é impossível não reconhecer nos sintomas de Anna O., o caráter sexual que envolvia representações como “cobra, enrijecimento e paralisia do braço”.  Breuer não teria sabido reconhecer o caráter sexual dos sintomas.  No entanto, Freud reconhece que o relato da experiência de Breuer com Anna O., com toda sua intensidade no que tange às questões vividas no que ele reconhece como um “rapport sugestivo”, testemunhariam uma experiência já ordenada em termos de uma situação transferencial.,  Assim, tratar-se-ía, segundo as palavras do próprio Freud  de algo que serviria “como um perfeito protótipo do que chamamos hoje de transferência”(21).  Tal afirmação freudiana, reforça e aprova nosso intuito de demonstrar que  Breuer, ao conduzir o tratamento de annaO., mesmo sem o saber, esteve lidando com questões próprias ao campo da transferência.
Ainda, ao justificar o limite da experiência de seu colega, Freud conclui que: “Breuer deve ter descoberto por outros indícios a motivação sexual dessa transferência, mas a natureza universal deste fenômeno lhe escapou, resultando daí que, como se tivesse sido surpreendido por um ‘fato inconveniente’, ele tenha interrompido qualquer investigação subsequente”.(21)
É preciso afirmar, a partir da própria crítica que Freud dirige à Breuer, que , no que diz respeito ao problema da transferência, ela se fará apresentar sempre como um “fato inconveniente”.  Se a gravidez de Anna O. tornou-se o ponto máximo de desespero de Breuer, se isso impôs de uma vez por todas o limite entre o que pôde ser tratado por seu método catártico, também para Freud a transferência, ao menos no início, será tomada como um corpo estranho e indesejável.  Toda a diferença é que Freud, ao contrário de Breuer, não se recusará a aceitar o desafio imposto pela transferência.  Ao contrário, sua demarche fará da transferência, um conceito fundamental e constituinte do campo psicanalítico.

                                                                       
                                                                            Ana O.




                                                                         Josef Breuer

UM ESTUDO SOBRE A TRANSFERÊNCIA NA OBRA DE SANDOR FERENCZI

UM ESTUDO SOBRE A TRANSFERÊNCIA NA OBRA DE SANDOR FERENCZI

por CARLOS MARIO ALVAREZ

UFRJ - 1997

Dissertação de mestrado submetida ao corpo docente do Programa de Pós-Graduação em Teoria Psicanalítica do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de mestre.

212 FLS


Banca Examinadora:

Chaim Samuel Katz
Joel Birman
Teresa Pinheiro (orientadora)

Grau Obtido : A+ (indicada para publicação)


Entrando em contato com a publicação teórica do Psicanalista Carlos Mario Alvarez

Nossa proposta em poucas palavras...

Este Blog publicará pesquisas, textos, idéias e pensamentos do Psicanalista carioca Carlos Mario Alvarez. O autor é membro fundador da Sociedade de Psicanálise Formação Freudiana (1992), Mestre em Teoria Psicanalítica pela UFRJ (1997), Doutor em Letras pela PUC-RIO (2012). É, atualmente, professor convidado da Universidade La Sorbonne, Paris 2 - Ciffop. Criador do Projeto Psicanálise Descolada (2014), Carlos Mario Alvarez tem publicado diversos videos na internet (You tube,  Facebook) onde contribui para renovar e atualizar as temáticas que interessam aos Psicanalistas estudantes e curiosos do tema.

A primeira série de publicações deste Bolg levará a conhecimento público a pesquisa de mestrado realizada por Carlos Mario Alvarez cujo tema foi a obra de Sandor Ferenczi e o título da dissertaçào de mestrado foi "um estudo sobre a transferência na obra de Sandor Ferenczi".

Este Blog publicará semanalmente a sequência dos 4 capítulos que compõe o trabalho defendido na UFRJ diante de uma banca que foi composta por Chaim Samuel Katz, Joel Birman e Teresa Pinheiro ( orientadora). O trabalho recebeu grau A+ tendo sido fortemente recomendado para publicação. A publicação não aconteceu em livro, até o presente momento, por motivos aqui desconhecidos.

À época da defesa (1997) Ferenczi era ainda um autor pouco conhecido e pouco lido no País.
Acreditamos que, hoje em dia, um número maior de pessoas possam vir a se interessar por este trabalho.

A dissertação foi dividida em 4 capítulos: 1) A Transferência na primeira tópica freudiana; 2) A Transferência nos primeiros escritos de Ferenczi; 3) A Transferência no período da técnica ativa e; 4) A Transferência no período da Neocatarse.

O trabalho de editoração e publicação será coordenado por Luiz Santos, atualmente um dos colaboradores do Projeto Psicanálise Descolada

Este Blog se destina a levar ao grande público a produção teórica do Psicanalista Carlos Mario Alvarez e, com este gesto, ajudar a fomentar o debate em Psicanálise na língua portuguesa.

Boa Leitura!!

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(foto: Carlos Mario Alvarez em palestra para alunos de graduação de Psicologia, 2015).